segunda-feira, abril 30, 2007


às fogueiras de beltane
a primeira chama
de um quase inverno


Zoe
lua cheia em libra, sol em touro
- na minha cidade, a noite está azul.

domingo, abril 22, 2007



Dou minhas palavras


Vão, palavras, vão!
E não é querer dizer
mas já vão tarde.
Cansei de falá-las
aos gritos de alarde
ou de silenciá-las
por nem querer saber.

Vão, palavras, vão!
Fica o dito pelo não,
pelo sim, pelo menos.
Quem sabe, um dia,
sabê-las aos centos
me valha uma sinfonia
entre pausas e acentos.

Vão, palavras, vão!
Significá-las em mim
não pega bem o espírito
de minha alma querubim.
A grande alegria do circo
é o palhaço pegar fogo
e incendiar o público todo.

Vão, palavras, vão.
E se esparramem pelo chão.
Para que nunca mais
nenhum de seus radicais
venham a perder o latim
como se falassem grego
e o resto fosse segredo

()

Thadeu Wojciechowski

quarta-feira, abril 18, 2007




OS MENSAGEIROS



A palavra de lesma na chapa de folha?
Minha é que não é. Não a aceite.

Ácido acético em lata lacrada?
Não o aceite. Genuíno é que não é.

Um anel de ouro com o sol dentro?
Mentiras. Mentiras e dor.

Geada numa folha, o imaculado
Caldeirão, proseando e frigindo

De si para si no topo de cada um
Dos nove Alpes negros.

Um turtuveio nos espelhos,
O mar espedaçando o seu, cinza —

Amor, amor, estação minha.


Silvia Plath

segunda-feira, abril 16, 2007

SONDA




O silêncio que me imagina
É o seu sonhar surdo e mudo
Onde invado sua sisma
E de nada encontro tudo

É uma planície profunda
Um lugar sobre-humano
Lá rastejam murmúrios
Onde me perco e me dano

É o céu do submundo
Um rio tocado por cores
Meio tom a cada minuto
O tempo de um outro plano

É lá que me fundo sempre
É sempre onde me afundo
O silêncio que me imagina
E seu sonhar surdo e mudo



Monica
11 de abril de 2007

sexta-feira, abril 13, 2007



DEFINIÇÃO



O cigarro de fumaça impalpável e brasa colorida,
que se fuma a si mesmo num cinzeiro,
será um poeta?...


João Guimarães Rosa

sábado, abril 07, 2007


Medusa (Plath)

Desta restinga de boquilhas pétreas,
Olhos revirados por varetas brancas,
Orelhas tapando as incoerências do mar,
Você abriga sua bola-Deusa-cabeça enervante,
Lentes de piedades,

Suas comparsas
Refestelando as células loucas na sombra da minha quilha,
Forçando adiante como corações,
Chagas vermelhas bem no centro,
Cavalgando a vazante até o ponto de partida mais próximo,

Arrastando seus cabelos de Jesus.
Será que escapei?
Minha mente serpenteia até você
Velho onfalosito concheado, cabo Atlântico,
Mantendo-se, ao que parece, num estado de restauração milagrosa.

Em qualquer caso, você está sempre lá,
Respirar trêmulo no final da minha linha,
Curva d’água sobre-pulando
Pro meu molinete, ofuscante e agradecida,
Tocando e sugando.

Eu não chamei você.
Eu não chamei você mesmo.
Não obstante, não obstante
Você veio a vapor pra mim sobre o mar,
Gorda e vermelha, uma placenta

Paralisando os amantes convulsivos.
Luz ofídia
Espremendo o respirar dos sinos de sangue
Da fúcsia, eu não conseguia inspirar,
Morta e sem dinheiro,

Superexposta, como um raio X.
Quem você pensa que é?
Uma hóstia de Comunhão? Maria Carpideira?
Não aceitarei nenhuma mordida do seu corpo,
Garrafa na qual eu vivo,

Vaticano cadavérico.
Estou morta de enjôo do sal quente.
Imaturos como eunucos, seus desejos
Assobiam pros meus pecados.
Sai, sai, tentáculo de enguia!

Não há nada entre nós.


Sylvia Plath
versão brasileira: Ivan Justen Santana

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Medusa (Pound)

À medusa oramos,
petrificando o solo com o escudo,
Segurando-o para baixo
ele endureceu o trilho
Polegada, ante nós, a polegada,
a matéria resistindo,
As cabeças surgiam do escudo,
silvando, mantidas para baixo.
Vermes devorando,
a cara só a meia potência.
As línguas das serpentes
lambendo o cimo da lavadura,
Martelando a mixórdia até sólida,
a estreita tira,
Meia largura de um fio de espada.
Desta maneira por males terríveis,
ora se afundando, ora firmando-se,
Segurando o escudo insubmersível.
Oblívio,
esqueço quanto tempo,
sono, náusea de desmaiar.
"Quer em Naishapur ou na Babilónia"
Ouvi no sonho.
Desaparecido Plotino,
E escudo amarrado por baixo de mim acordei;
O portão girou nos gonzos;
Ofegante como um cão doente, cambaleava,
Banhei-me em alcali, e em ácido.
[...]
cego da luz do sol,
Olhos inchados, repousei,
palpebras a fechar, escuridão inconsciente


Ezra Pound

terça-feira, abril 03, 2007


bonnie & clyde


Balada do amor através das idades


Eu te gosto, você me gosta
desde tempos imemoriais.
Eu era grego, você troiana,
troiana mas não Helena.
Saí do cavalo de pau
para matar meu irmão.
Matei, brigamos, morremos.

Virei soldado romano,
perseguidor de cristãos.
Na porta da catatumba
encontrei-te novamente.
Mas quando vi você nua
caída na areia do circo
e o leão que vinha vindo,
dei um pulo desesperado
e o leão comeu nós dois.

Depois fui pirata mouro,
flagelo da Tripolitânia.
Toquei fogo na fragata
onde você se escondia
da fúria do meu bergantim.
Mas quando ia te pegar
e te fazer minha escrava,
você fez o sinal da cruz
e rasgou o peito a punhal...
Me suicidei também.

Depois (tempos mais amenos)
fui cortesão de Versailles,
espirituoso e devasso.
Você cismou de ser freira...
Pulei muro de convento
mas complicações políticas
nos levaram à guilhotina.

Hoje sou moço moderno,
remo, pulo, danço, boxo,
tenho dinheiro no banco.
Você é uma loura notável,
boxa, dança, pula, rema.
Seu pai é que não faz gosto.
Mas depois de mil peripécias,
eu, herói da Paramount,
te abraço, beijo e casamos.

Carlos Drummond de Andrade

flash gordon & dale arden

domingo, abril 01, 2007




Pegue um jornal.
Pegue a tesoura.
Escolha no jornal um artigo do tamanho que você deseja dar a seu poema.
Recorte o artigo.
Recorte em seguida com atenção algumas palavras que formam esse artigo e meta-as num saco.
Agite suavemente.
Tire em seguida cada pedaço um após o outro.
Copie conscienciosamente na ordem em que elas são tiradas do saco.
O poema se parecerá com você.
E ei-lo um escritor infinitamente original e de uma sensibilidade graciosa, ainda que incompreendido do público.


Tristan Tzara