terça-feira, julho 25, 2006

O caranguejo


O terrível caranguejo que devora
seios, pâncreas, próstatas,
afunda suas patas de insistência fixa
em um grande útero de plástico.
Destino limitado, pois não tem
carne de sua escolha para morder,
água potável ou sangue.

Talvez não se tenha querido
oferecer todo o quadro.
O Zôo, no entanto,
mostra o principal, nem mais nem menos
que em outras capitais importantes.

À direita, junto ao gângster.



NICOLÁS GUILLÉN
Trad.Marcelo Tápia


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Caranguejola


Ah, que me metam entre os cobertores,
e não me façam mais nada!...

Que a porta do meu quarto fique sempre fechada
que não se abra mesmo para ti se tu lá fores!

Lã vermelha, leito fofo. Tudo bem calafetado...

Nenhum livro, nenhum livro à cabeceira...

Façam apenas com que eu tenha sempre ao meu lado
bolos de ovos e uma garrafa de madeira.

Não, não estou para mais; não quero mesmo brinquedos.

Pra quê? Até se mos dessem não saberia brincar...

Que querem fazer de mim com estes enleios e medos?

Não fui feito pra festas. Larguem-me!

Deixem-me sossegar...

Noite sempre pelo meu quarto. As cortinas corridas, e eu aninhado a dormir, bem quentinho – que amor!...

Sim: ficar sempre na cama, nunca mexer, criar bolor pelo menos era o sossego completo... História! Era a melhor das vidas.

Se me doem os pés e não sei andar direito,
pra que ei de teimar em ir para as salas, de Lord?

Vamos, que a minha vida por uma vez se acorde
com o meu corpo, e se resigne a não ter jeito...

De que me vale sair, se me constipo logo?

E quem posso eu esperar, com minha delicadeza?...

Deixa-te de ilusões, Mário! Bom edredon, bom fogo
e não penses no resto. É já bastante, com franqueza...

Desistamos. A nenhuma parte a minha ânsia me levará.

Pra que hei de então andar aos tombos, numa inútil correria?

Tenham dó de mim.

Co'a breca! Levem-me pra enfermaria!

Isto é, pra um quarto particular que o meu pai pagará; justo. Um quarto de hospital, higiênico, todo branco, moderno e tranqüilo; em Paris é preferível, por causa da legenda...

Daqui a vinte anos a minha literatura talvez se entenda; e depois estar maluquinho em Paris fica bem, tem certo estilo...

Quanto a ti, meu amor, podes vir às quintas–feiras, se quiseres ser gentil, perguntar como eu estou.

Agora no meu quarto é que não entras, mesmo com as melhores maneiras...

Nada a fazer, minha rica. O menino dorme.

Tudo o mais acabou.


Mário de Sá-Carneiro

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