quinta-feira, abril 27, 2006





imóvel
pousada na relva comodamente assentada
com forma irregular________arredondada
características graníticas

- o tom terroso a distingue -

silenciosa
cercada de verde por todos os lados
respira o dia anil
indiferente ao sol que a assola.

- caberia na concha das mãos -

nunca será um peso sobre o papel
nem produzirá círculos concêntricos
em algum lago real
não quebrará vidraças
nem derrubará latas e garrafas
servindo ao exercício de pontaria de alguém

mas ninguém subestima
a pedra feita de letras.


Alexandre Brito

psiu: o gaúcho Alexandre Brito , além de poeta e um dos editores da AMEOPOEMA, integra a banda Os poETs. É um tal de poema poeta pedra e pilha pra tudo quanto tudo quanto é lado.

domingo, abril 23, 2006


poema objeto de Marcelo Sahea
do livro Leve


Amor


leve como leve pluma
muito leve leve pousa
na simples e suave coisa
suave coisa nenhuma

sombra silêncio ou espuma
nuvem azul que arrefece

simples e suave coisa
suave coisa nenhuma
que em mim amadurece


Secos e Molhados
Composição: João Ricardo/João Apolinário

segunda-feira, abril 17, 2006



A NAMORADA


Ela está de pé nas minhas pálpebras
com os dedos nos meus entrelaçados.
Ela cabe toda em minhas mãos,
ela tem a cor dos meus olhos
e desaparece na minha sombra
como uma pedra sobre o céu.

Tem sempre os olhos abertos
e não me deixa dormir.
Os sonhos dela à luz do dia
fazem os sóis evaporar-se,
fazem-me rir, chorar e rir,
falar sem ter nada a dizer.


Paul Eluard


segunda-feira, abril 10, 2006




Hermitage / Miró



Amor de tarde


É uma pena você não estar comigo
quando olho o relógio e já são quatro
e termino a planilha e penso 10 minutos
e estico as pernas como todas as tardes
e faço assim com os ombros para relaxar as costas
e estalo os dedos e arranco mentiras.

É uma pena você não estar comigo
quando olho o relógio e já são cinco
e eu sou uma manivela que calcula juros
ou duas mãos que pulam sobre quarenta teclas
ou um ouvido que escuta como ladra o telefone
ou um tipo que faz números e lhes arranca verdades.

É uma pena você não estar comigo
quando olho o relógio e já são seis.
Você podia chegar de repente
e dizer “e aí?” e ficaríamos
eu com a mancha vermelha dos seus lábios
você com o risco azul do meu carbono.


Mario Benedetti
Tradução de Julio Luís Gehlen

sábado, abril 01, 2006


Hino à Afrodite


Afrodite imortal de faiscante trono
Filha de Zeus tecelã de enganos, peço-te:
A mim nem mágoa nem náusea domine,
senhora do ânimo.

Mas aqui vem-se já uma vez
A minha voz ouvindo-a de longe
Escutaste e do pai deixando a casa áurea vieste
Atrelado o carro. Belos te levavam
Ágeis pássaros acima da terra negra
Contínuas asas vibrando vindos do céu
através do ar.

E logo chegaram. Tu ó venturosa
Sorrindo no rosto imortal indagas
O que de novo sofri, a que de novo te evoco,
O que mais desejo de ânimo louco
que aconteça. Quem de novo convencerei
“a acolher” teu amor? Quem Safo
te faz sofrer?

“Se bem agora fuja, logo te perseguirá,
“se bem teus dons recuse, virá te dar,
“se bem não ame, logo amará – ainda que
“ela não queira”

Vem junto a mim ainda agora, desfaz
O áspero pensar, perfaz quanto meu ânimo
Anseia ver perfeito. E tu mesma – sê
minha aliada.


Safo
p.s.: o original em grego e diversas traduções para o inglês podem ser vistas clicando aqui. Se alguém conhecer alguma outra versão para o português, ou ainda, a autoria da tradução acima, agradeço incontinenti o envio.