A Última dança de Salomé
texto: Oscar Wilde
direção: Ken Russel
A SEDUÇÃO
SALOMÉ – Iokannan !
IOKANNAN – Quem fala?
SALOMÉ – Apaixonei-me pelo seu corpo, Iokannan ! É um corpo branco como lírio num campo intocado pela foice. É branco como a neve nas montanhas de Judá que desce até os vales. As rosas do jardim da Rainha da Arábia não são tão brancas quanto seu corpo. Nem as rosas do jardim da Rainha da Arábia, o jardim de perfumes da Rainha da Arábia, nem as pegadas da Aurora sobre as folhas, nem o seio da lua ao se pôr no colo do mar... nada no mundo é tão branco como seu corpo. Deixe que eu toque seu corpo.
IOKANNAN – Para trás, filha da Babilônia ! Foi pela mulher que o mal veio ao mundo. Não fale comigo. Não desejo ouvi-la. Ouço só a palavra de Deus.
SALOMÉ - Seu corpo é horrível. É como o corpo de um leproso. É como o caminho por onde passaram serpentes onde os escorpiões fizeram seu ninho. É horrendo. Seu corpo é horrendo. É seu cabelo que eu amo, Iokannan. Seu cabelo é como cachos de uvas, como cachos de uvas negras suspensos nas vinhas da Iduméia, no país dos idumeus. São como os cedros do Líbano, os grandes cedros do Líbano que dão sombra aos leões e ladrões que se escondem de dia. As longas noites negras, quando a lua se esconde e as estrelas sentem medo não é tão escuro como seu cabelo. Nada no mundo é tão negro quanto seu cabelo... Deixe que eu toque seu cabelo.
IOKANNAN – Para trás, filha de Sodoma. Não me toque ! Não viole o templo de Deus !
SALOMÉ – Seu cabelo é horrível ! Coberto de lama e pó. É como uma coroa de espinhos na sua testa. Um emaranhado de cobras enrolando-se no seu pescoço. Não estou apaixonada pelo seu cabelo...É a sua boca que eu amo, Iokannan. A sua boca é como uma faixa escarlate ao redor de uma torre de marfim. Uma romã cortada por uma faca de marfim. A flor da romã que nasce nos jardins de Tiro, mais vermelha que a rosa, não é mais vermelha que ela. Os gritos rubros da trombeta anunciando a vinda de reis que amedronta o inimigo não são tão vermelhos. Sua boca é mais vermelha do que os pés de quem amassa uvas nos caldeirões de vinho. É mais vermelha que os pés da pomba que vive nos templos alimentada por sacerdotes. É mais vermelha que os pés de quem vem da floresta após matar um leão e de quem já viu tigres dourados. Sua boca é como um galho de coral que o pescador achou na meia luz do mar e guardou para dar ao rei. É como o cinabre encontrado nas minas de Moab e que os reis confiscaram. É como o arco do rei da Pérsia pintado de vermelho com a tinta do coral. Nada no mundo é tão rubro quanto sua boca... Deixe que eu beije sua boca.
IOKANNAN – Nunca. Filha da Babilônia, filha de Sodoma, nunca !
SALOMÉ – Beijarei sua boca, Iokannan. Beijarei sua boca.
NARRABOTH, o Pajem da Síria – Princesa, princesa, a senhora que é um buquê de mirra, a pomba das pombas, não olhe para esse homem. Não diga essas coisas. Eu não suporto. Não diga essas coisas.
SALOMÉ – Beijarei sua boca, Iokannan.
(Narraboth se mata com uma punhalada no ventre e cai entre João Batista e Salomé)
GUARDA – Princesa, o jovem Capitão se matou.
IOKANNAN – Não tem medo, filha de Herodíades? Não avisei que ouvi as asas do anjo da morte? O anjo não veio?
SALOMÉ – Deixe que eu beije sua boca.
IOKANNAN – Filha de adúltera. Só um homem pode salvá-la. ( ...)
SALOMÉ – Deixe que eu beije sua boca.
IOKANNAN – Amaldiçoada seja, filha de mãe incestuosa. Maldita seja !
(João Batista cospe na boca de Salomé e ela lambe os lábios)
IOKANNAN – Não olharei para você. Está amaldiçoada, Salomé. Está amaldiçoada.
SALOMÉ – Beijarei sua boca, Iokannan. Beijarei sua boca.
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(trecho do filme, copiado dos letreiros e comparado com a versão
em francês, por Zoe de Camaris)
Um comentário:
A marcas da pantera é um dos filmes dos filmes. :O)
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