Medusa de Fogo
A simples bulha surda
Do meu coração batendo
Poderá te acordar.
Mesmo a penugem da lua
Que cai sobre o ombro nu
Das árvores, tão de leve,
Poderá te acordar.
A simples caída da bolha
D'água sobre a folha,
Por ser fria como a neve,
Poderá te acordar.
Só porque a rosa lembra
Um grito vermelho,
Retiro-a de diante do espelho
Porque - de tão rubra -
Poderá te acordar.
E se nasce a manhã
Calço-lhe logo pés de lã,
Porque ela, com seus pássaros,
Poderá te acordar.
Mesmo o meu maior silêncio,
O meu mudo pé-ante-pé,
De tão mudo que é,
Não irá te acordar?
Ó medusa de fogo,
Conserva-te dormida.
Com o teu fogo ruivo e meu,
Qual monstruosa ferida.
Como data esquecida.
Como aranha escondida
Num ângulo da parede.
Como rima água-marinha
Que morreu de sede.
E eu serei tão breve
Que, um dia, deixarei
Também, até de respirar,
Para não te acordar.
Ó medusa de fogo,
Dormida sob a neve!
Cassiano Ricardo
Um comentário:
Zoe, muito prazer. Sou poeta e tarólogo. Ainda não conheço Curitiba, mas indo praí vou conhecer a Utopia. Abraços.
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