domingo, maio 29, 2005

PERSEU


Bernard Collet / Meduse


O Triunfo da Argúcia Sobre o Sofrimento
Sivia Plath


Apenas a cabeça mostra você no prodigioso ato
De digerir o que apenas séculos digerem:
O mamute, claudicante estatuária de tristeza,
Indissolúvel o bastante para enigmar as entranhas
De uma baleia com buracos e buracos, e sangrá-la branca
Nos mares salgados. Hércules não teve problemas,
Lavando aqueles estábulos: lágrimas de um bebê o fariam.
Mas quem voluntar-se-ia para engolir o Laocoonte,
O Cárcere Mortal e aquelas inumeráveis pietás
Ulcerando as paredes sombrias de capelas da Europa,
Museus e sepulcros?
Você.
Você
Que emprestou penas a seus pés, não chumbo,
Não pregos, e um espelho para manter a cabeça ofídia
Em perspectiva segura, podia encarar a careta-górgone
Da agonia humana: um olhar para amortecidos
Membros: não um piscar-basilisco, não um duplo nham,
Mas todos os acumulados últimos grunhidos, gemidos,
Gritos e dísticos heróicos concluindo as milhões
De tragédias encenadas nestes tablados sanguencharcados,
E cada aflição privada, uma serpente sibilante
Para petrificar seus olhos, e cada catástrofe
Municipal, uma extensão convulsa de cobra,
E o declínio de impérios a grossa casca de uma vasta
Anaconda.
Imagine: o mundo
Socado a uma cabeça de feto, barrancado, cosido
Com sofrimento desde a concepção para cima, e aqui
Está ele à mão. Saibro no olho ou um dedão
Machucado fazem qualquer um se encolher, mas o globo todo
Expressivo de pesar torna deuses, como reis, em rochas.
Aquelas rochas, rachadas e gastas, por si mesmas então vão
Se estremunhando e estendem o desespero na face
Escura da terra.
Assim o rigor mortis viria a endurecer
Toda criação, não fosse uma barriga maior
Ainda que engole a alegria.
Você entra agora,
Armado com penas tanto para cócegas quanto vôos,
E um espelho de parque de diversões que transforma a musa trágica
Na cabeça decapitada de uma boneca soturna, uma trança,
Uma serpente enlameada, pendurando-se débil como a absurda boca
Pendura-se em seu lúgubre amuo. Onde estão
Os clássicos membros da teimosa Antígone?
Os robes vermelhos reais de Fedra? As lagrimalumbradas
Tristezas da gentil duquesa de Malfi?
Idas
Na convulsão profunda segurando sua face, músculos
E tendões enfeixados, vitoriosos, como a cósmica
Risada acaba com as incosturáveis, pestilentas feridas
De um eterno sofredor.
Para você
Perseu, a palma, e possa você sopesar
E contrapesar até o tempo parar, a celestial balança
Que pesa nossa loucura com nossa sanidade.



Espelho português: Ivan (Perseu) Justen Santana

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