quarta-feira, novembro 22, 2006


A ERA



Minha era, minha fera, quem ousa,
Olhando nos teus olhos, com sangue,
Colar a coluna de tuas vértebras?
Com cimento de sangue – dois séculos –
Que jorra da garganta das coisas?
Treme o parasita, espinha langue,
Filipenso ao umbral das horas novas.


Todo ser enquanto a vida avança
Deve suportar esta cadeia
Oculta de vértebras. Em tôrno
Jubila uma onda. E a vida como
Frágil cartilagem infantil
Parte seu ápex: morte da ovelha,
A idade da terra em sua infância.


Junta as partes nodosas dos dias:
Soa a flauta, e o mundo está liberto,
Soa a flauta e o mundo se recria.
Angústia! A onda do tempo oscila
Batida pelo vento do século.
E a víbora na relva respira
O ouro da idade, áurea medida


Vergôntea de nova primavera!
Mas a espinha partiu-se da fera,
Bela era lastimável. Era,
Ex-pantera flexível, que volve
Para trás, riso absurdo, e descobre
Dura e dócil, na meada dos rastros,
As pegadas de seus próprios passos.



Ossip Mandelschtam

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