"A poesia é apenas a evidência da vida. Se sua vida está queimando bem, a poesia é só a cinza" - LEONARD COHEN
terça-feira, agosto 16, 2005
O poema de Plath é inspirado nesta pintura de Henri Rousseau
La Charmeuse de Serpents
ENCANTADORA DE SERPENTES
Como os deuses começaram um mundo, e o homem outro,
Assim a encantadora de serpentes começa uma esfera serpiforme
Com lua-olho, boca-flauta. Ela flauteia. Flauteia verde. Flauteia água.
Flauteia água verde até verdes águas tremularem
Com juncosas extensões e istmos e ondulações.
E ao se entrelaçarem verdes suas notas, o rio verde
Modela as próprias imagens em volta de suas canções.
Ela flauteia um lugar pra ficar de pé, mas sem pedras,
Sem piso: uma onda de tremeluzentes línguas de relva
Sustenta seu pé. Ela flauteia um mundo de serpentes,
De gingados e coleios, a partir do fundo serpienraizado
De sua mente. E agora nada a não ser serpentes
Está visível. As serpiescamas se tornaram
Folha, tornada pálpebra; serpicorpos, galho, busto
De árvore e humano. E de dentro dessa serpentidade
Ela comanda as contorções que fazem manifesta
Sua serpenteza e seu poder com melodias flexíveis
Saídas de sua flauta esguia. Deste ninho verde afora,
Como do umbigo do Éden afora, retorcem-se as filas
De gerações serpiformes: que haja serpentes!
E serpentes houve, há, haverá – até que bocejos
Consumam essa flautista e ela se canse da música
E flauteie o mundo de volta ao tecido simples
Da serpiurdidura, serpitrama. E flauteie o pano de serpentes
Até uma fusão de águas verdes, até que nenhuma serpente
Mostre a cabeça, e aquelas águas verdes de volta pra
Água, pro verde, pra nada semelhante a uma serpente.
E acondicione sua flauta, e empalpebre seu enluarado olhar.
Sylvia Plath
Versão brasileira: Ivan Justen Santana
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